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Editor: José Trindade



terça-feira, 15 de março de 2011

Reforma Tributária: o que o Pará quer ou Pode?

Por José Damasceno

Início de mandato é um momento diferencial no tempo político. É o momento em que se tem força política e não se tem eleições para criar obstáculos à aprovação de projetos polêmicos, e a reforma tributária é um deles, se não o principal. É o projeto que todos sabem que precisa ser discutido e rapidamente definido novo regime tributário para o país.



É um assunto que incomoda a todos, o setor empresarial reclama que precisa ser construído uma estrutura tributária que crie um ambiente mais competitivo dentro e fora do país; reclama também da tributação excessiva sobre a folha de pagamento, da cumulatividade, da complexidade do sistema tributário. Do lado dos trabalhadores, a excessiva carga tributária sobre a renda e o consumo destoa dos péssimos serviços prestados à população.

Do lado dos Governos, a União se esforça para concentrar receitas em suas mãos e Estados e Municípios lutam para que a partilha da arrecadação federal seja mais justa. Os Estados do sul e sudeste dizem que sustentam economicamente o norte e o nordeste, esses por sua vez, declaram que o Governo Federal prioriza a desoneração tributária e investimentos no centro sul do país. Enfim todos estão descontentes.

Apesar do descontentamento, quase todos são céticos na celeridade da discussão e aprovação da reforma tributária, porém uma hora vai vir, e ao que tudo indica esse é o ano. E a Amazônia e o Pará, o que eles querem na reforma tributária? Qual a reforma tributária que nos interessa? Nossos parlamentares e governantes estão preparados para participar qualitativamente dessa discussão? Vai-se lutar por uma reforma tributária ou uma reforma fiscal? Àquela que envolve não só o que arrecada, como arrecada e quanto arrecada, mas defini também como se reparte o bolo tributário, quais os gastos ficam com quem, União, Estados e Municípios.

Volta e meia vê-se, questionamentos sobre a Lei Kandir, Lei que há quinze anos desonera as exportações da cobrança de ICMS, e a época foi aceita passivamente pelos Estados e hoje deve produzir ao Pará uma perda anual líquida de R$ 1 bilhão, como, esses recursos sofrem vinculações constitucionais, retira dos municípios R$ 750 milhões, da educação R$ 187,5 milhões e R$ 90 milhões.
Nunca, independente de que partido esteja no comando federal, as perdas financeiras oriundas da Lei Kandir forma repostas; no Pará, logo no segundo ano da vigência as perdas líquidas, a preços de hoje, seria algo próximo de R$ 533, milhões. Tem-se que considerar que a recomposição dos valores perdidos, é uma luta inglória, a classe empresarial não aceitaria a revogação da Lei, até porque ela já foi constitucionalizada pela EC nº 42/2003, o que torna tudo mais difícil; e o Governo Federal não vai aportar recursos do seu orçamento para cobrir essas perdas.

Deve-se ainda incorporar a essa discussão os créditos das aquisições de bens de uso e consumo compensáveis de ICMS obtidos no consumo de mercadorias para quitar débitos desse imposto, é um montante expressivo, porém ninguém o sabe com precisão.

No final do ano passado, por pressão dos secretários de fazenda, a utilização desses créditos foi prorrogada pela sétima vez, tendo seu aproveitamento postergado para janeiro de 2020; é evidente que essa postergação e quase insegurança jurídica, pesa no planejamento tributário das empresas e certamente é repassado ao consumidor. Esse elemento tem que ser posto na discussão de uma reforma, seja ela tributária ou fiscal, afinal quando de fato forem efetivado seu aproveitamento, haverá impactos nas finanças de estados e municípios.

É inadimíssivel que uma Lei Federal, apesar de aprovada pelos nossos deputados, adentre na autonomia e competência tributária de outro ente, cause sérios danos ao erário público e consequentemente à população e não haja ressarcimento no mesmo nível, para nós paraenses isso é fundamental que seja colocado na pauta da reforma.

Entre as justificativas para a provação da Lei, e ainda hoje essa idéia é muito forte, era que para crescer e ser competitivo, o país não tinha que exportar tributo, e com a desoneração o aumento da competitividade, as eventuais perdas seriam compensadas pela alteração do perfil das exportações e o conseqüente crescimento econômico. É evidente que a carga tributária é elevada, seja pra consumo interno ou exportação, não se pode negar o fato, entretanto, por si só isso não é determinante para o ganho de competitividade e para o crescimento da economia, deve-se se somar a isso, outros elementos como, o conhecimento, a logística e a diminuição da burocracia.

A ratificação disso é que, em 1997, do total das exportações brasileiras, 27,3% era de produtos básicos, em 2009 sobe para 40,5%; no Pará, nesse mesmo período esse segmento exportado sai de 46,1% para 65,38%, ou seja, a edição da Lei Kandir, apesar do expressivo crescimento das exportações, não trouxe alteração no perfil exportador, pelo contrário, o Brasil e o Pará, continuam elevando as participações dos produtos primários, ou seja, commodities cujos preços são determinados nas bolsas de Londres e Nova Iorque.

Outro ponto que tem que ser objeto de discussão na reforma, é a capacidade e a margem que os Estados têm de expandir, dentro do seu espaço geográfico, as atividades produtivas. Acreditamos que hoje, na Amazônia Legal as unidades de conservação ambiental, ocupam em torno de 50% do seu território; no Pará essa participação dever estar em torno de 60%; são áreas legalmente protegidas e sua exploração econômica é extremamente limitada ou quase inexistente, e devem realmente ser assim, em função da preservação ambiental; entretanto os Estados devem ser de alguma forma compensados, por essa limitação de crescimento de suas economias e conseqüente geração de receitas próprias, isso tem que ser posto nas discussões da reforma tributária e, principalmente, as limitações tributárias por fatores ambientais devem fazer parte das variáveis dos coeficientes de partilha tanto do Fundo de Participação dos Estados, o FPE e dos Municípios, o FPM.

Quanto ao FPE, é importante lembrar que devido Ações Diretas de Inconstitucionalidade – ADINs ajuizadas pelo Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás, o Supremo Tribunal Federal – STF, declarou em fevereiro de 2010 a inconstitucionalidade de parte da Lei Complementar 62/89, Lei que define os critérios de rateio do Fundo, mencionando que a mesma só terá validade até 31 de dezembro de 2012, a partir dessa data, os coeficientes, hoje congelados a revelia do Código Tributário Nacional – CTN; ou serão atualizados conforme os Arts. 88 a 90 do CTN, ou terão novas variáveis para a formação do novo coeficiente de repartição entre os Estados da Federação. Se os coeficientes forem simplesmente descongelados e seguir o que emana o CTN, o Pará, segundo algumas projeções, hoje perderia cerca de R$ 350 milhões.

As variáveis consideradas tanto pela LC 62/89 como pelo CTN são: o inverso da renda per capta, população e superfície territorial, ou seja, não há variáveis ambientais, na formação dos coeficientes, elemento que certamente contribuiria para que o Pará não absorvesse mais essa perda dentro do “pacto federativo”.

Outro Ponto que está fora da reforma tributária, mas que pode ser um dos elementos de compensação das perdas da Lei Kandir é a carga tributária sobre a mineração. O Pará é um Estado eminente minerador precisa-se discutir com seriedade e perspectivas de futuro tanto as alíquotas da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais – CFEM, quanto a elevação da participação dos Estados na distribuição dos royalties.

Essas são algumas questões que o Pará deve se apropriar rápida e intensamente, para que no momento das discussões e mobilizações da reforma, seja tributária ou fiscal, não ficar à margem do dito pacto federativo, e eternamente se lastimando de ter perdido o trem da história.

José Damasceno é Economista da Secretaria de Fazenda do Estado do Pará, tendo exercido a função de Secretário Adjunto da Fazenda do Pará no Governo Ana Júlia.

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