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Editor: José Trindade



quinta-feira, 24 de março de 2011

Entrevista com Aluízio Leal


Entrevistamos o Professor Aluízio Lins Leal, da Faculdade de Economia da Universidade Federal do Pará e que estuda a economia amazônica e paraense já há mais de quarenta anos. Em artigo recentemente republicado na Revista de Estudos Paraenses do Instituto de Desenvolvimento Econômico, Social e Ambiental do Pará (Idesp), Aluízio que é Doutor em Economia pela Universidade de São Paulo (USP), ressalta que desde a colonização a Amazônia sempre foi objeto de “saque”, sendo que seus “recursos naturais sempre estarão a serviço da redução dos custos do Capital, nas fronteiras desenvolvidas da sociedade capitalista, para atender o Lucro, motor da cumulação”.

É desde essa percepção radical e necessariamente critica que ele vislumbra que somente em “uma sociedade na qual sobressaia a importância do caráter humano, e das relações estáveis, de aproximação entre o Homem e a Natureza – e não a intenção pura e simples da pilhagem que acompanha a cobiça capitalista” é que podemos esperar um “futuro íntegro da Amazônia”. Conclui seu artigo afirmando que somente o marco do socialismo “pode dar a ela esse futuro”. Segue a entrevista na integra.


PD13 - Professor, o senhor estuda nos últimos 40 anos a sistemática de ocupação, apropriação e uso dos recursos naturais amazônicos. Poderia nos resumir os diferentes momentos da história econômica amazônica?

Aluízio - Os marcos, por assim dizer, dessa história,são: a) as expedições exploradoras que tocaram a Região:Pinzón, Orellana, e Pedro de Ursua/Lope de Aguirre, desde os fins do século XV e durante o século XVI; b) a presença colonial de outros povos,sobretudo holandêses, antes, ainda, da fundação de Belém; c) o período colonial português das drogas do sertão; d) o período pombalino; e) o começo sistemático da investigação científica da Amazônia iniciada ainda no século XVIII, por La Condamine, e, depois, Humboldt/Bonpland, e continuado por boa parte do século XIX; f) o período gomífero - a rigor, das três últimas décadas do século XIX ao início da segunda década do século XX; g) a fase de recessão provocada pela quebra gomífera,e as propostas do Imperialismo para a Região; f) o anteato da ocupação recente, que se dá com os Acôrdos de Washington e a Batalha da Borracha; g) a ocupação recente, antecipada pela Belém-Brasília e a chegada de grandes corporações transnacionais controladoras de vastos territórios; h) a ocupação promovida pela Ditadura Militar, e o início da subordinação direta da Amazônia à Divisão Internacional do Trabalho do pós-guerra; i) a onda de ocupação e exploração atual, em sintonia com a crise capitalista e a carência crescente de matérias primas, pela sociedade de consumo de massa.


PD13 - Esses diferentes momentos se relacionam ao próprio desenvolvimento da acumulação capitalista internacional, que lições podem ser tiradas, para as futuras gerações, principalmente do ciclo gomífero?

Aluízio - Que a absoluta incompetência da subburguesia regional em controlar capital através do contrôle da tecnologia, e a sua tendência absoluta em se colocar a serviço das grandes burguesias que vêm de fora - ambas de raiz histórica -, mostram que nós nunca resolveremos os problemas da Região de dentro da realidade econômica, social e política vigente. Tudo isso atesta a tendência secular em reproduzir o caráter colonial das atividades de exploração da Amazônia, sempre decididas fora dela, sempre comandadas de fora dela e por gente que não é filha dela - o que demonstra a inteira ausência de perspectivas de mudança enquanto êsse quadro continuar a comandar a nossa realidade.

PD13 - Considerando os aspectos levantados na questão anterior, referente ao ciclo da borracha, quais os elementos mais contraditórios, no seu entender, naquela fase da história econômica amazônica?

Aluízio - É um elemento só, contradição fundante da realidade colonial, e reproduzido em todos os momentos da nossa história: uma terra extraordinariamente abundante de riquezas naturais,cujo povo, em contrapartida e por isso mesmo, tem que estar submetido a uma crescente miséria.


PD13 - O atual processo econômico paraense, centralmente focado na produção mineral para exportação, acaba por reproduzir diversos condicionantes semelhantes ao grande ciclo da borracha, como analisar esses diferentes momentos, considerando as alterações históricas no modo de produção capitalista?

Aluízio - A ocupação recente da Amazônia, iniciada sob a Ditadura Militar e a ignorância esclarecida dos militares, teve, como objetivo maior, colocar os recursos naturais dela a serviço da reorganização capitalista pós-Segunda Guerra Mundial, assentada sobretudo na estratégia de mundialização da sociedade de consumo de massa. É por isso a voracidade crescente por êsses recursos, e o objetivo de usar crescentemente a Região para os propósitos de sobrevivência do sistema capitalista, que se fundam na intensificação da produção para o consumo de massa. Por isso os enormes projetos de exploração mineral, os enormes projetos energéticos,o avanço rápido e vigoroso da produção de alimentos e dos biocombustíveis, voltadas ao suporte da produção alimentar ou das necessidades consumidoras dos mercados dos grandes países desenvolvidos – e os seus conseqüentes efeitos colaterais (como o trabalho escravo, por exemplo) que fazem parte da conta amarga e travosa a ser paga pelos filhos duma região tão rica em Natureza.


PD13 - Quais são, no seu entender, os limites ao processo de "saque" que o senhor caracteriza enquanto ponto comum nos diversos momentos de nossa história econômica?

Aluízio - Não há êsse limite. O limite dêle é a voracidade do sistema capitalista por riquezas naturais que ele converte em Capital. E ela é ilimitada.


PD13 - Que aspectos centrais destacaria para se pensar o futuro da Amazônia, especialmente do estado do Pará?

Aluízio - Nós não temos saída dentro do contexto atual. A saída está fora dêle.

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