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Editor: José Trindade



domingo, 25 de setembro de 2011

Crônica Medievalista VI: A Primavera da Humanidade


Por Zé Lins

Eram 2061, sem demora os dias corriam ou transbordavam desvairados. Tudo ou quase tudo gritava, porém sem ouvidos ou novas ideias. O mundo era ou não o velho mundo, porém o que interessava eram os debates frenéticos no Congresso Nacional, onde, pela primeira vez, após diversas tentativa infrutíferas de conciliação das diversas regiões que compunham a República Unida do Brasil, cada uma, maior ou menor, se transformariam elas próprias em poderes nacionais autônomos.

Como toda essa coisa veio a ocorrer não é possível descrever em poucas linhas, só se sabe que corria a indagação principal: como o Império estava se desfazendo? E ao se desfazer, o que restará?

O Brasil se tornara, de forma totalmente imprevisível para qualquer transeunte em qualquer esquina do planeta, a principal potência imperial capitalista a partir de meados da década de 40.

As crises capitalistas se tornaram mais fortes e recorrentes desde meados dos anos 20. Uma das consequências diretas foi tornar os EUA e a Europa Ocidental poderes econômicos e militares equivalentes e, aos poucos, menores frente às novas ou não tão novas potências euroasiáticas. O Império Chinês estava completamente constituído na segunda década desse século derradeiro da forma humana. Em 2038, as relações econômicas, bélicas e naturais marcaram um ponto de encontro, sem suavidade, porém com hora definida.

Europa e EUA firmaram pacto bélico, distinto da OTAN e claramente ofensivo aos novos interesses beligerantes Chinês e Russo. A Rússia e a Ásia menor pareciam agora definitivamente partes do poder capitalista imperial Chinês. Essa previsível engenharia geopolítica, previsível, diga-se de passagem, desde a década de 20 do século XXI, tinha unicamente pontos de exceção na América do Sul, especificamente o Brasil e a área de influencia em torno do MERCOSUL.

A República da Índia constituíra com a China, Rússia e Paquistão um único bloco, talvez o mais expressivo poder que tenha surgido nos últimos cem anos da atribulada história humana. A Europa e o decadente Tio Sam, após nova guerra de secessão, se uniram e estabeleceram um arco de forças baseado no velho imaginário de um mundo passado. O “American Way of Life” já há muito tinha entrado para os anais dos registros históricos sucumbido sobre si mesmo.

Vida e morte, poder e capital, se encontraram nas vias de fato nos anos seguintes e tal como nos meados do século XX, os medianos do século XXI ameaçavam tudo e todos, somente que agora as forças em disputa destruiriam o pobre do planeta Terra milhões de vezes e, provavelmente, as naves espaciais expandiriam a disputa para além do sistema solar.

O planeta parece que tinha pressentido que seus animais mais dotados entrariam em mais uma e talvez derradeira disputa total. As sirenes ecoaram de leste a oeste, os epicentros dos terremotos múltiplos apontavam para diversos centros das recalcitrantes forças em disputa; ao mesmo tempo ogivas de menor poder de destruição eram detonadas como avisos do estopim derradeiro. Pequim foi literalmente arrasada, por terremotos e detonações nucleares. Nova Yorque caia quebrantada por tsunamis e ogivas que destruíram Manhatam, produzindo cenário de devastação em toda ilha. A rebeldia da natureza agravou as consequências das pueris ações humanas. Xangai, Moscou, Los Angeles, Paris e Londres foram parcialmente destruídas.

O Brasil e sua área de influência estabeleceram uma área de exclusão de disputa no Cone Sul. A região se tornou porto seguro para capital e mentes. Os fluxos de capital rapidamente debandavam das principais frentes de guerra, ao mesmo tempo Brasil, Argentina e Uruguai recepcionavam parcelas da elite mundial, fugida de suas próprias contendas e como ratos destemidos que escapam ao naufrágio, essa escória aportava nas terras brasílis.

Na medida em que a crise capitalista evoluía para uma crise de existência da própria humanidade, embaixadores brasileiros tentavam construir pontes de conversação e dirigir o alto comissariado de uma ONU despedaçada. Os anos que se seguiram aos trágicos eventos da década de 30 foram espantosos. A humanidade ferida elevou seu ego às alturas e como cegos desesperados buscavam alguma luz. Durante quinze anos dos escombros das até então principais cidades do planeta exalavam podridão. A desorganização dos Estados de diversos países e a radiação nuclear dificultava a reconstrução e a recuperação foi muito mais lenta que um século antes. A humanidade tinha sido reduzida em um terço, retornávamos ao mesmo quantitativo humano da década de 10, de qualquer forma restavam 9 bilhões de humanos para dar continuidade a sua sina histórica, fosse o imaginário de Douglas Adams, fosse o imaginário de Adoux Haley.

O Brasil tinha saído extremamente fortalecido do conflito, tal como cem anos antes a guerra paria uma nova potência imperial capitalista. Durante quinze anos do pós-guerra e cataclismos o Brasil se tornara a fábrica do Mundo, ao mesmo tempo a flexibilidade cultural brasileira possibilitou os primeiros debates internacionais sobre a construção de um novo padrão de desenvolvimento econômico. Mesmo com a resistência dos Comodoros do capitalismo, cresciam as experiências de comutalismo em diversos países.

Foi nesse quadro mundial confuso que as disputas federativas se intensificaram, transformada, aos poucos, em beligerância entre regiões. O que tornava o quadro diferenciado é que em tão pouco tempo o Brasil ia do céu ao inferno, não que fosse inusitado na história desse país o conflito aberto e as divergências provinciais, principalmente em função das marcantes desigualdades e imposição de interesses do Brasil branco sulista, porém o rápido declínio de uma nova potência imperial parece que demarcava os estertores do próprio capitalismo.

Era um setembro chuvoso na maior parte do Mundo, a decisão no Brasil atraia a atenção do universo humano, e o esfacelamento da mais rápida experiência imperial capitalista parece que marcava em definitivo a primavera da humanidade.  

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