O Proposta Democrática publica a opinião do Prof. Aluizio Leal sobre a questão da criação de novas unidades federativas. Desde já vale observar que a posição de Aluizio é totalmente diversa deste editor do blog. O Prof. Aluizio busca demonstrar os reais fatores que estariam por trás da divisão. Nosso papel é colocar diferentes posições em contraponto e assim o fazemos, somente um último detalhe a ortografia do texto é do próprio autor, o qual nos solicitou não alterá-la. Desejamos a todos boa leitura na continuidade de um debate que, ao nosso ver, deve ser radicalmente democrático, e a isso nos prestamos. Publica-se agora a primeira parte.
Por Aluizio Lins Leal (Prof. UFPA)
Todo novo Estado surge por DOIS motivos:
1) Quando existe um
interêsse econômico suficientemente forte para cria-lo sôbre um dado
território,de modo que o Estado a ser criado atenda diretamente a êsse
interêsse econômico;
2) Quando já
há,localmente,um grupo econômico forte o suficiente para reclamar para si o
contrôle direto do poder político.Porque o contrôle direto do poder político
permite que se manipule como bem se entenda a criação das leis,a emissão de
decretos,a concessão de benefícios e privilégios,etc.
Os interessados na criação de um novo
Estado,portanto,sempre são dois: aquêles cujos interêsses serão atendidos com o
surgimento dêle – isto é,aquêles cujo poder econômico vai ser beneficiado pelas
novas leis,pelos decretos,pela concessão de benefícios,vantagens e privilégios;
e aquêles a quem vai caber o poder de criar as leis,emitir os decretos,fazer as
concessões,etc. .Portanto,êsses interessados sempre são ou aquêles que serão beneficiados,ou
aquêles a quem caberá beneficiá-los.Por isso mesmo sempre se estabelece entre êsses
dois grupos um jôgo de cartas marcadas,que é próprio do contrôle do poder.Todos
sabem que jôgo é esse,porque todos os dias os noticiários dos jornais e da
televisão estão cheios das notícias sôbre negociatas,malversação de verbas, desvios
de recursos ,concessão de vantagens e privilégios,etc.,ou seja: coisas que só
podem acontecer pelas mãos de quem tem o poder de controlar e manipular o
aparelho institucional,o aparelho do Estado.E todas as notícias sôbre essas
falcatruas confirmam que os envolvidos nelas SEMPRE são os dois grupos acima:os
que se beneficiam delas,e os que têm responsabilidade direta na montagem delas,e
que dividem com os primeiros os “frutos” dessa “empreitada” . E,é claro, funcionários
dos órgãos públicos – geralmente subordinados aos segundos – bem como
personagens do segmento privado,sempre associados aos primeiros,que ajudam essa
arapuca a funcionar. O caráter de “cartas marcadas” dêsse jôgo se deve à
relação que está na base dêle:os primeiros financiam as campanhas políticas dos segundos,e êstes,uma
vez no poder,atendem aos interêsses dos que os “financiaram” ,tendo como elo e
regra comum a corrupção. Simples,bem simples e objetivo.
Tem-se ouvido com freqüência a alegação de
que a criação de um novo Estado é,por si só,um ato de democracia.Vamos com
calma. A base da Democracia é a igualdade social.Essa igualdade tem
que ser estruturada pela base,isto é,com emprêgo
– mas salários dignos! – para todos,educação para todos,saúde pública para
todos,previdência
para todos. E não surge de um passe de mágica
ou apenas da mera vontade geral.Isso só surge quando acontece uma mudança
profunda NA BASE da sociedade,coisa que JAMAIS acontecerá à sociedade brasileira
no contexto econômico e social em que ela vive.Assim,quantos forem os Estados
que vierem a criar nêste país,o que vai continuar em todos eles é a
desigualdade,vigorosamente mantida pela prática da corrupção,que se exprime na
péssima qualidade da Educação,do sistema de Saúde,da Previdência – além,é
claro, do alicerce de tudo isso: os malditos salários indecentes,e as péssimas condições
materiais de vida para a absoluta maioria do povo. Dêste modo,qualquer que seja
o novo Estado que se crie nêste contexto econômico e político em que vivemos nem
só o que surgirá,junto com êle,não será a vontade soberana do povo – mas a
soberania da corrupção,que marca todos os aspectos da nossa vida econômica e
política – como,também,êle não vai surgir dessa “soberana vontade
popular”,porque, como sempre,em todos os processos eleitorais,a cada quatro
anos se convoca o povo para votar e eleger os que vão ajudar a enganá-lo e oprimí-lo
pelos próximos quatro.Só cabe ao povo,portanto, comparecer e votar,enganado
pelas velhas e surradas cantilenas,cujo tema muda de acôrdo com os objetivos do
momento,para que os interêsses dos poderosos sejam atendidos. Não é o povo quem
elege os políticos.Quem elege os políticos
são os que financiam a sua eleição,e é por isso que o povo sempre ficou fora
do poder. Assim,pensar ou alegar que a “vontade do povo” vai ter fôrça para
enfrentar a corrupção e vencê-la,numa realidade como a nossa,é atestado de
ingenuidade ou má intenção,acabando por fazer o jôgo ideológico do poder.O que
sempre vai prevalecer é a fôrça dos corruptos,armada do contrôle do poder
político.Com êle nas mãos, ninguém os vence.
Mas por que,então não sustar isso? Porque
NÃO É POSSÍVELSUSTAR.Na nossa formação histórica a corrupção se incorporou
ajudada pela impunidade.Isso fêz de ambas valores culturais tão básicos, que se
arraigaram de modo tão completo,que,NO CONTEXTO DÊSTE SISTEMA,é impossível
extirpá-las.Elas fazem parte da nossa realidade social,e enquanto não forem
reformadas AS BASES da sociedade brasileira,a corrupção,ajudada pela
impunidade,jamais desaparecerá.Os políticos se conferem o “direito” de “se recompensarem”
pela sua “contribuição” à “ordem” ao se permitirem inteiramente,pela corrompida
estrutura pública,saquear os recursos que,por dever moral,deveriam ser empregados
em favor do povo – mas que são dilapidados em favor próprio pelos devassos ocupantes
do poder. Quem quiser perceber como funciona êsse esquema,e o quanto essa corja
se beneficia a si própria com a manipulação dos recursos do povo,é só prestar
atenção aos quadros dirigentes das administrações estaduais ou municipais,toda
vez que sobe ao poder um novo grupo: logo,logo, gente pertencente ao novo
quadro “dirigente” que antes não possuía qualquer sinal expressivo de patrimônio,passa,de
repente,a exibir uma saúde financeira e patrimonial invejável, fruto da prática
da corrupção,que grassa como uma peste em todos os cantos da administração
pública dêste país. E os recursos que são alvo dessa prática sempre são os destinados às necessidades sociais mais
básicas,porque
sempre são elas – as necessidades do povo – as mais fáceis e mais frágeis frente
à voracidade da corrupção,que é a marca do exercício do poder político, principalmente em um país como o Brasil.Por exemplo: nunca
se roubou tanto,nas prefeituras brasileiras,quanto depois da municipalização
dos gastos do SUS e do FUNDEF,coisas absolutamente essenciais à construção da
igualdade democrática através da Saúde e da Educação; mas que, imediatamente,passaram
a ser uma inesgotável fonte de recursos a favor do indecente enriquecimento
privado de prefeitos e seus apaniguados. Com toda a certeza, qualquer pessoa
conhece um caso dêsses,no seu Estado ou no seu município – com os corruptos
inteiramente impunes. Quem sabe,até hoje,de pelo menos um dêsses ladrões que tenha
sido alcançado pela Justiça e pôsto na cadeia?
Os casos de Estados ou desmembramentos
territoriais SEMPRE mostraram que por trás dêles sempre estão aquelas duas
razões – um interêsse econômico forte,ou um forte grupo econômico que quer
controlar diretamente o poder político.Não importa se isso se passa em um
contexto nacional ou internacional:a lógica sempre é a mesma.Podemos citar três
casos disso – um nacional, e dois internacionais:Panamá,Israel,e o Amapá.Quando
o comércio mundial,já em processo de contrôle pelos norteamericanos,passou a
exigir que se criasse uma passagem entre o Atlântico e o Pacífico que
eliminasse os altos custos da travessia que costeava dois continentes antes de dobrar
o sul da América do Sul,os Estados Unidos criaram,com o terrorismo ideológico
que lhes é peculiar e em que são mestres,uma campanha feroz pela “independência
do Panamá”,e convencendo os panamenhos de que era “uma aspiração histórica” o
seu desejo de “separar-se da Colômbia”, promoveram essa separação,à fôrça,para
tomar para si o Panamá e construir o Canal que serviria aos seus interêsses
econômicos,o que fêz com que,até hoje,o Panamá seja,na prática,um território sob
a mão de ferro do imperialismo norteamericano,muito embora pareça ser um “estado
soberano”,e, até mesmo,tenha “recebido as chaves” do Canal,que, contudo, até
hoje continua nas mãos dos seus “donos”,que arrancaram à Colômbia o território,
construíram o Canal e se apropriaram do novo país,inclusive impondo ou depondo os
seus presidentes ao seu bel-prazer, invadindo-o sempre que quiseram,e fazendo
dos panamenhos um povo sem qualquer poder de comando sôbre a sua própria terra.
Um outro caso é a criação de Israel,que teve como motivo,logo após a Segunda
Guerra Mundial,a necessidade de criar um Estado-Tampão para servir de
escudo de provocação preventiva contra a possível resistência,por parte dos
países árabes,que sediavam uma extraordinária riqueza natural – o petróleo –, contra
o interêsse das grandes corporações do capital petrolífero,que já haviam
decidido que tinham que ser as donas daquela incalculável riqueza natural,que havia
se tornado o ítem mais estratégico para a reorganização e a movimentação da
máquina de produção capitalista no pósguerra.Isso levou,mais uma vez,a uma
campanha ideológica – a campanha pela Terra
Prometida
dos judeus –, que justificou a amputação,ao território da Transjordânia,do
pedaço destinado a criar o Estado de Israel,que,fiel às razões pelas quais surgiu,transformou-se
num polo permanente de provocação e agressão contra todos os países que se
recusam a se submeter à ordem internacional localmente administrada para manter
o petróleo nas mãos das multinacionais. E o papel de Israel,como pólo de
provocação e plataforma de agressão militar,é absoluto e imprescindível em
todas as guerras que eclodiram naquela área,todas elas tendo por único motivo o
contrôle do petróleo.
O caso do Amapá,por
sua vez,está associado à decisão de reservar uma riqueza mineral estratégica –
o manganês – para as necessidades da produção siderúrgica do pósguerra,controlada
pelas grandes corporações multinacionais dos EUA no período da Guerra Fria,que
se inicia logo após o término da Segunda Guerra Mundial,o que fêz com que o
Amapá fôsse desmembrado do Pará sob a campanha pela “chegada do progresso”,para
que toda a sua extraordinária riqueza natural que era o manganês fôsse
inteiramente rapinada sob o contrôle de um consórcio de cara brasileira e DNA
norteamericano – a ICOMI -,que nada deixou lá após a sua passagem,a não ser a
mesma miséria de antes,e uma cidade,nascida do pôrto de exportação do
manganês,que se destaca pela amarga quantidade de adolescentes e crianças
envolvidas com o consumo de drogas e a prostituição.Em todos êsses três casos,o
real motivo que determinava a criação dêsses Estados era assunto proibido,para que,no seu lugar,surgissem os pretextos
solertes que “justificavam” isso, como o do “desejo de independência”,o “direito
a uma Terra Prometida”,e o do “anseio pelo progresso”.O resultado é o que se
conhece.
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