Por José Raimundo
Trindade ( Professor da UFPA)
Reza um velho ditado entre os
economistas que os números “devidamente torturados confessam qualquer
coisa”. Essa crença parece ser à base da disputa política do PSDB estadual e de
seu governo. De forma persistente os tucanos fazem referência a uma possível
suspensão das operações de crédito, já que o Pará, segundo sua propaganda
“encontrava-se em situação de inadimplência, causado pelo desequilíbrio fiscal
de 2010” (conferir: Agência Pará de Notícias, 18/10/2011).
Como mentira tem perna curta, basta
consultar o Diário Oficial do Estado (DOE), para desmentir parte desse
discurso. Pois bem, ainda em abril deste ano o atual governador sanciona a Lei
n° 7.508, que autorizou o Estado do Pará a contratar financiamento com a Caixa
Econômica Federal até o valor de R$ 170.759.756,00 (cento e setenta milhões,
setecentos e cinquenta e nove mil e setecentos e cinquenta e seis reais)
(conferir: Diário Oficial, 20/04/2011).
A disputa política ao ser tratada como desfaçatez acaba produzindo como
principal efeito o uso da mentira como principal meio de desqualificação dos
adversários, porém uma das consequências dessa forma de fazer política é o
completo desprezo pelos reais interesses da população, o que talvez seja por
isso que obras importantes como o “Ação Metrópole” tenha sido paralisado,
deixando a população da Região Metropolitana de Belém sem uma solução efetiva
para o caótico trânsito que vitima e produz enormes custos sociais e de vidas
humanas.
A disputa política tendo como base os números fiscais do estado voltou à
baila novamente, quando da aprovação de um novo Programa de Ajuste Fiscal (PAF),
sendo que contraditoriamente a Agência Pará noticia (no último 18/10) que “o
Estado está liberado para voltar a efetuar operações de crédito”. Ora, pura
contradição, na medida em que quase seis meses antes, o Diário Oficial do
Estado, como acima citado, tinha publicado lei governamental que sancionava
autorização para novo empréstimo.
As contradições, porém, não param por ai. Ao buscar justificar sua
leniência mediante a imputação da velha ideia da “herança maldita”, valeria ao
atual governador olhar as contas públicas que deixou quando do seu primeiro
mandato. Em janeiro de 2007 quando Ana Júlia assumiu o governo do estado do
Pará o quadro financeiro era desolador, sendo os dados de conhecimento público
e o Sistema Integrado de Administração Financeira (SIAFEM) permite a devida
conferência, mostrando que a posição bancária no dia 02/01/2007 consolidava na
Conta Única do BANPARÁ aproximadamente R$ 158 mil e na conta do Banco do Brasil
aproximadamente R$ 23 mil, o que totalizava algo em torno de R$ 181 mil.
Portanto, o governo que iniciou em 2007 assumiu a administração em um quadro de
literal caixa vazio.
O documento de “Avaliação da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) sobre a
Situação Financeira do Estado do Pará”, denotou, em abril de 2007, que no ano
de 2006 “o Estado apresentou déficit primário de R$ 60 milhões” e com esse
resultado “o Estado incorreu em deficiência financeira de R$ 53 milhões”. Este
foi o quadro descrito pelos técnicos do Tesouro Nacional quando da “missão” de
análise e revisão do “Programa de Reestruturação e Ajuste Fiscal do Estado do
Pará” (PAF).
Ora o que significa os referidos números, primeiramente que o déficit
primário apontado é um resultado somente operacional, ou seja, movimentos de
antecipação de valores de um ano para o outro podem aumentar ou diminuir esse
“hiato”, por mais que seja vedado pela Lei Federal n° 4.320 tal procedimento.
Entretanto o governo que se encerrou em 2006, antecipou receitas provenientes
do FPE, IPI e demais receitas no montante de R$ 79.589.975,72, do dia 10 de
janeiro de 2007 para 31 de dezembro de 2006, para fechamento das contas de 2006
(conferir: Tribunal de Contas do Estado)
. Deste modo, o primeiro governo Jatene tanto deixou o estado inadimplente,
como também incorreu no descumprimento da citada lei, como assinalado pelos técnicos do Tribunal de
Contas do Estado, além de contrair despesas para serem pagas com recursos de
2007, sob a forma de Despesas do Exercício Anterior (DEA).
É no mínimo curioso que o mesmo gestor que tenha dado vasão a esse
conjunto de práticas pouco louváveis, venha agora se utilizar do discurso de
“herança maldita”, inclusive para justificar sua leniência e o trato que tem
dado a educação, por exemplo. Vale concluir fazendo algumas observações
necessárias:
i) Ainda na
gestão Ana Júlia, se buscou incluir como um dos compromissos do Programa de
Ajuste Fiscal (PAF) assumidos com a Secretaria do Tesouro Nacional (STN), o
princípio de disponibilizar na internet, os resultados das contas públicas, isso
com intuito de demonstrar, com transparência, a gestão dos recursos públicos.
Assim é possível observar no site da SEFA a verdade sobre o assunto (conferir: SEFA/PAF).
ii) Ao se
analisar o PAF 2010 (item 01 – Programa de Ajuste Fiscal 2010-2012, página 10,
item 35) observa-se a exigência dos seguintes “Resultados Primários” (em
milhões de R$): 2010: 21; 2011: 100 e 2012: 151.
iii) Para 2010,
a meta dois do Programa era não ultrapassar o déficit primário, conforme acima
especificado. No caso de eventual frustração de alguma receita, o Estado se
comprometia a adotar medidas necessárias em termos de aumento de outras
receitas e/ou diminuição de despesas, de forma a alcançar o resultado primário
estabelecido. E, na eventualidade de não conseguir realizá-lo, o Estado se
comprometia a não gerar atrasos/deficiências, o que de fato foi observado.
iv) O resultado
primário é apenas uma parte da análise para comprovação da suficiência
financeira do Estado. Isso pode ser demonstrado pelo próprio PAF 2011 e pela Avaliação
STN 2011/2013, contida no oficio do Secretário do Tesouro Nacional (Sr. Arno Augustin)
ao Governo do Estado do Pará, sobre a real situação financeira do Estado do
Pará em 2010, ambos obtidos no sítio da Secretaria de Fazenda (SEFA).
v) O dado mais
importante refere-se a chamada “deficiência financeira", ou seja a maior
saída de recursos em relação a entrada, em um determinado período. Como pode
ser atestado no item quatro do citado oficio do STN: a deficiência financeira
no ano de 2010 foi de R$ 50 milhões, sendo que, ainda segundo o referido
documento, nos anos de 2009 e 2008, o “Estado apresentou suficiência de
recursos de R$ 124 milhões e R$ 10 milhões, respectivamente”. Tecnicamente,
isso quer dizer que os R$ 134 milhões que sobraram dos anos anteriores, foram
suficientes para cobrir o déficit de 2010.
vi)
Diferentemente do governo anterior (primeiro governo Jatene) não se observou
“antecipação de receitas” algo vedado pela legislação, por isso o valor a maior
do “déficit primário”. Vale observar que ao considerarmos o mesmo princípio de
“deficiência financeira” o documento do STN de “Avaliação sobre a Situação
Financeira do Estado do Pará” referente ao ano fiscal de 2006 assinalou uma
deficiência financeira de R$ 53 milhões, portanto superior a que está
assinalada no mesmo documento referente ao ano fiscal de 2010.
vii) As
condições financeiras do estado do Pará são tão positivas que em documento do
próprio atual governo encaminhado ao STN, referente ao “Programa de
Reestruturação e Ajuste Fiscal” (2011/2013), no item 18 (p. 05) assinala que “o
nível de endividamento do estado do Pará está inferior ao estabelecido pela Lei
n° 9.496/97”, registrando um coeficiente de endividamento de 0,37. Tanto é
assim que o STN não colocou empecilhos na renovação do PAF, sendo inclusive,
que o valor referente a meta de resultado primário a ser alcançada em 2011 é
inferior a de períodos anteriores (R$ 51 milhões) logo após processos
eleitorais.
A verdade final, portanto, é que as contas do Estado em 2010
foram aprovadas e legitimadas pela decisão da Secretaria do Tesouro Nacional,
sendo que os recursos na ordem de R$ 134 milhões que sobraram dos anos
anteriores (2008/09), cobriram com sobra o déficit de R$ 50 milhões das contas
de 2010, possibilitando, ainda, que o atual governo retivesse uma massa
expressiva de recursos para realizar a gestão no primeiro ano de governo,
diferentemente da realidade encontrada em 2007. Por outro, as operações de
crédito que o governo Ana Júlia possibilitou, garantem o financiamento de obras
marcantes para Belém e estado do Pará, especialmente em áreas como transporte, saúde
e desenvolvimento. A verdade dos fatos sempre se impõe e como um antigo
aforisma cristão expressa: “a verdade liberta e a mentira aprisiona”.
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