Espaço de debate, crônica crítica do cotidiano político paraense e de afirmação dos pressupostos de construção de um Pará e Brasil Democrático e Socialista!

Editor: José Trindade



sábado, 30 de julho de 2011

AECONOMIA

Nesses dias em que a tônica da mal quebrantada sociedade estadunidense aprofunda sua(s) crise(s) e, especialmente, a disputa entre os diversos conservadorismos se manifestam, nosso colaborador Zé Lins retorna, após merecida ausência de férias, nos brindando com o sentido mais incômodo do que seja os desequilíbrios da divida pública e da crise do capital.

Bom final de Julho e excelente final de férias!

Por Zé Lins

Os déficits bárbaros sussurram

sobre químicas de equilíbrios distantes,
superávits se acumulam sobre as pálpebras dos tempos vazios,

quimeras numéricas se enaltecem sobre os limites dos dividendos,

contai, cantai
subtrais, submetes

Sobre as pálpebras do empolgado equilíbrio orçamentário.

Eis o orçar, fundar, fundir
Eis às equações do incontestável desequilíbrio,
desfazer a alienação, refazer a vida,
perfazer o encanto e reencontrar o dia.
Desfazer o equilíbrio,
reencontrar o contrário,
de contra o capital

Eis o mar.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

"Podemos estar perto de reviver a crise de 1930"

Paul Krugman:  "Podemos estar perto de reviver a crise de 1930"
Para aqueles que conhecem a história da década de 1930, o que está ocorrendo agora é muito familiar. Se alguma das atuais negociações sobre a dívida fracassar, poderemos estar perto de reviver 1931, a bancarrota bancária mundial que alimentou a Grande Depressão. Mas se as negociações tiverem êxito, estaremos prontos para repetir o grande erro de 1937: a volta prematura à contração fiscal que terminou com a recuperação econômica e garantiu que a depressão se prolongasse até que a II Guerra Mundial finalmente proporcionasse o "impulso" que a economia precisava. O artigo é de Paul Krugman.

Esta é uma época interessante, e digo isso no pior sentido da palavra. Agora mesmo estamos vivendo, não uma, mas duas crises iminentes, cada uma delas capaz de provocar um desastre mundial. Nos EUA, os fanáticos de direita do Congresso podem bloquear um necessário aumento do teto da dívida, o que possivelmente provocaria estragos nos mercados financeiros mundiais. Enquanto isso, se o plano que os chefes de Estado europeus acabam de pactuar não conseguir acalmar os mercados, poderemos ter um efeito dominó por todo o sul da Europa, o que também provocaria estragos nos mercados financeiros mundiais.

Somente podemos esperar que os políticos em Washington e Bruxelas consigam driblar essas ameaças. Mas há um problema: ainda que consigamos evitar uma catástrofe imediata, os acordos que vêm sendo firmados dos dois lados do Atlântico vão piorar a crise econômica com quase toda certeza.

De fato, os responsáveis políticos parecem decididos a perpetuar o que está sendo chamado de Depressão Menor, o prolongado período de desemprego elevado que começou com a Grande Recessão de 2007-2009 e que continua até o dia de hoje, mais de dois anos depois de que a recessão, supostamente, chegou ao fim.

Falemos um momento sobre por que nossas economias estão (ainda) tão deprimidas. A grande bolha imobiliária da década passada, que foi um fenômeno tanto estadunidense quanto europeu, esteve acompanhada por um enorme aumento da dívida familiar. Quando a bolha estourou, a construção de residências desabou, assim como o gasto dos consumidores na medida em que as famílias sobrecarregadas de dívidas faziam cortes.

Ainda assim, tudo poderia ter ido bem se outros importantes atores econômicos tivessem aumentado seu gasto e preenchido o buraco deixado pela crise imobiliária e pelo retrocesso no consumo. Mas ninguém fez isso. As empresas que dispõem de capital não viram motivos para investi-lo em um momento no qual a demanda dos consumidores estava em queda.

Os governos tampouco fizeram muito para ajudar. Alguns deles – os dos países mais débeis da Europa e os governos estaduais e locais dos EUA – viram-se obrigados a cortar drasticamente os gastos diante da queda da receita. E os comedidos esforços dos governos mais fortes – incluindo aí o plano de estímulo de Obama – apenas conseguiram, no melhor dos casos, compensar essa austeridade forçada.

De modo que temos hoje economias deprimidas. O que propõem fazer a respeito os responsáveis políticos? Menos que nada. A desaparição do desemprego da retórica política da elite e sua substituição pelo pânico do déficit tem verdadeiramente chamado a atenção. Não é uma resposta à opinião pública. Em uma sondagem recente da CBS News/The New York Times, 53% dos cidadãos mencionava a economia e o emprego como os problemas mais importantes que enfrentamos, enquanto que somente 7% mencionava o déficit. Tampouco é uma resposta à pressão do mercado. As taxas de juro da dívida dos EUA seguem perto de seus mínimos históricos.

Mas as conversações em Washington e Bruxelas só tratam de corte de gastos públicos (e talvez de alta de impostos, ou seja, revisões). Isso é claramente certo no caso das diversas propostas que estão sendo cogitadas para resolver a crise do teto da dívida nos EUA. Mas é basicamente igual ao que ocorre na Europa.

Na quinta-feira, os “chefes de Estado e de Governo da zona euro e as instituições da UE” – esta expressão, por si só, dá uma ideia da confusão que se tornou o sistema de governo europeu – publicaram sua grande declaração. Não era tranquilizadora. Para começar, é difícil acreditar que a complexa engenharia financeira que a declaração propõe possa realmente resolver a crise grega, para não falar da crise europeia em geral.

Mas mesmo que pudesse, o que ocorreria depois? A declaração pede drásticas reduções do déficit “em todos os países salvo naqueles com um programa” que deve entrar em vigor “antes de 2013 o mais tardar”. Dado que esses países “com um programa” se veem obrigados a observar uma estrita austeridade fiscal, isso equivale a um plano para que toda a Europa reduza drasticamente o gasto ao mesmo tempo. E não há nada nos dados europeus que indique que o setor privado esteja disposto a carregar o piano em menos de dois anos.

Para aqueles que conhecem a história da década de 1930, isso é muito familiar. Se alguma das atuais negociações sobre a dívida fracassar, poderemos estar perto de reviver 1931, a bancarrota bancária mundial que tornou grande a Grande Depressão. Mas se as negociações tiverem êxito, estaremos prontos para repetir o grande erro de 1937: a volta prematura à contração fiscal que terminou com a recuperação econômica e garantiu que a depressão se prolongasse até que a II Guerra Mundial finalmente proporcionasse o impulso que a economia precisava.

Mencionei que o Banco Central Europeu – ainda que, felizmente, não a Federal Reserve – parece decidido a piorar ainda mais as coisas aumentando as taxas de juros?

Há uma antiga expressão, atribuída a diferentes pessoas, que sempre me vem à mente quando observo a política pública: “Você não sabe, meu filho, com que pouca sabedoria se governa o mundo”. Agora, essa falta de sabedoria se apresenta plenamente, quando as elites políticas de ambos os lados do Atlântico arruínam a resposta ao trauma econômico fechando os olhos para as lições da história. E a Depressão Menor continua.

(*) Paul Krugman é professor de Economía em Princeton e Prêmio Nobel 2008.

Tradução: Katarina Peixoto

Fonte: Sinpermiso

terça-feira, 19 de julho de 2011

Crise avança mais rápida e forte e favorece avanço de novo sistema

Está ficando cada vez mais clara a recidiva da crise de 2008, só que de forma mais ampla e virulenta. As avaliações de vários analistas que enfocam os problemas da zona do euro e dos EUA pioram dia a dia. Os países mais frágeis do sul da Europa não têm condições de resolver seus elevados déficits fiscais e reduzir suas dívidas. Eles não conseguirão pagar as prestações que assumiram e os calotes irão se suceder atingindo o sistema financeiro em efeito dominó. No caso de recidiva da crise, o Brasil não pode titubear e continuar seguindo o que dita o mercado financeiro e os economistas conservadores. O artigo é de Amir Khair.

Amir Khair

O sistema capitalista sofre seu mais duro golpe, ao evidenciar que é inviável por ser incapaz de controlar os fluxos financeiros que caminham com vida própria, independente da produção de bens e serviços da chamada economia real.

Ao invés de se apoiar no atendimento das necessidades de acesso da maior parte da população mundial especialmente das marginalizadas dos países ditos em desenvolvimento aos bens e serviços, endereçou sua expansão artificializando o excesso de consumo da população dos países do centro do capitalismo, (Estados Unidos, Europa e Japão). Essa artificialização se manifestou via empréstimos sem controle, ampliando volumes crescentes de títulos podres, que se espalharam como um câncer em expansão exponencial sem possibilidade de ser contido.

Partiu do princípio que esse sistema se auto-regularia, o que ficou evidenciado ser impossível. Está sendo duramente vitimado pela sua própria contradição interna, qual seja, ser incapaz de se desenvolver distribuindo os benefícios criados pelos trabalhadores e, pelo descontrole dos fluxos financeiros internacionais em busca desenfreada de lucros nas movimentações, que ultrapassam em volume centenas de vezes a movimentação de mercadorias.

• Recidiva - Nessa sequência está ficando cada vez mais clara a recidiva da crise de 2008, só que de forma mais ampla e virulenta. As avaliações de vários analistas que enfocam os problemas da zona do euro e dos Estados Unidos pioram dia a dia. Os países mais frágeis do sul da Europa não têm condições de resolver seus elevados déficits fiscais e reduzir suas dívidas, pois as medidas a que tiveram de se submeter de aperto fiscal e redução de salários e direitos criam, em contrapartida, efeito maior em queda de arrecadação, devido à redução da atividade econômica e elevação da inadimplência, pois os contribuintes passam a ter piores condições financeiras, e a primeira decisão que tomam é não pagar ou protelar o pagamento de impostos.

Assim, vai ficando mais claro que esses países não conseguirão pagar as prestações das dívidas que assumiram e os calotes irão se suceder atingindo o sistema financeiro privado em operação dominó, cujos reflexos podem ser de contaminação do sistema bancário de outros países como França, Alemanha e, como existem relações entre sistemas financeiros fortes entre Europa e Estados Unidos, este último poderá sentir os impactos financeiros, o que debilitaria ainda mais sua economia. Ao lado desse processo intensifica-se a mobilização social e manifestações públicas de reação da população atingida ou ameaçada pelas decisões de agravamento das condições de vida que usufruíam. Esse processo só tende a crescer.

Nos EUA, às voltas com o desenlace da autorização do Congresso para a elevação do teto da dívida do governo, a disputa política e a visão fiscal entre democratas e republicanos pode causar um trauma de proporções inimagináveis caso o acordo não saia. Os títulos americanos já sofreram a ameaça de rebaixamento nas agências de classificação de risco e, a economia até agora não eu sinais de recuperação do golpe sofrido em 2008, com elevado nível de desemprego, fragilidade no consumo interno e pouca competitividade externa face ao mercado internacional mais concorrencial, especialmente devido à posição agressiva das exportações do leste asiático, com destaque para a China.

Para agravar ainda mais esse quadro, a agência de classificação de risco Moody"s anunciou dia 13 ter colocado em revisão para potencial rebaixamento o rating soberano dos Estados Unidos, devido à possibilidade de o limite de endividamento não ser elevado em momento oportuno e, dessa forma, levar o país a declarar calote em suas obrigações de dívidas.

A Moody"s também colocou os ratings de instituições financeiras diretamente ligadas ao governo dos EUA em revisão para potencial rebaixamento. Entre elas, estão a Fannie Mae e a Freddie Mac.

Em abril, a Standard & Poor"s reduziu a perspectiva da classificação de estável para negativa, pois "Mais de dois anos depois do começo da crise, os formadores de política dos EUA ainda não chegaram a um acordo sobre como reverter a recente deterioração fiscal ou solucionar as pressões fiscais de longo prazo".

• Solução coordenada - Parece que não existe mais a possibilidade de uma solução coordenada de salvamento das economias dos países mais frágeis da zona do euro, nem perspectivas sólidas e duradouras de acordo para ampliar o limite de endividamento dos EUA. Há sérios riscos de empurrar o problema para frente tornando-o impossível de ser resolvido.

Esses países vão sentindo os golpes e o que prevalece é o salve-se quem puder. A crise de 2008 não conseguiu estabelecer regras para controlar os fluxos financeiros internacionais, que comandam o sistema capitalista e nem conseguirão agora, pois é da essência desse sistema ter vida própria, o que o vitimiza.

• Novo sistema - A China vem desenvolvendo, há mais de vinte anos, sistema próprio de um misto de capitalismo, abrindo espaços a iniciativas privadas e recebendo o ingresso de capitais e empresas de fora, mas sob controle do Estado e com plano estratégico de desenvolvimento. Como tem elevado exército de reserva no campo, os salários são baixos em relação à maioria dos países e seus trabalhadores não contam com a proteção da seguridade social. Com essa precarização do custo da mão de obra conseguem deslocar produtos de outros países no comércio internacional e continuam penetrando cada vez mais seus produtos em mercados que têm custos de mão de obra mais elevados. Seu calcanhar de Aquiles é que nesse processo os trabalhadores irão progressivamente reivindicar melhores condições salariais e de proteção do Estado, o que elevará gradualmente seus custos de produção. Temendo os reflexos de se apoiar em excesso no mercado externo o novo plano do Partido chinês é se voltar para buscar centrar sua expansão mais voltada para seu mercado interno, à semelhança do que já vem sendo feito por vários países emergentes.

• Trabalho x Trabalho – A lógica do sistema capitalista, em sua evolução, evidencia, com clareza, séria disputa entre trabalhadores no confronto internacional. Há deslocamentos de empregos e movimentos migratórios com ou sem controle na busca de oportunidades de trabalho. A tendência que parece natural, mas que precisa ser acompanhada e analisada é de um menor distanciamento entre custos de trabalho entre países, uma vez que a tecnologia pode se deslocar para sistemas produtivos sem maiores problemas, e essa tecnologia é mais diversificada e em forte processo de desenvolvimento. Não será surpresa se ocorrer gradualmente redução dos salários nos países hoje desenvolvidos e elevação nos emergentes dentro desse processo.

Em escala global isso pode ser um avanço, mas repito, é um processo a ser acompanhado e analisado, cabendo aos governos dos países adotarem estratégias de redução dos custos de reprodução da mão de obra, especialmente os relativos à alimentação, transporte, moradia, saúde, assistência social, bem como proteção ao emprego e preparo técnico da mão de obra. É a melhor forma de proteção de seus trabalhadores dentro dessa disputa internacional de custos de trabalho.

• Brasil – No caso desta recidiva da crise, o Brasil não pode titubear e continuar seguindo o que dita o mercado financeiro e os economistas ortodoxos e conservadores, com amplo espaço de expressão na mídia, criando um verdadeiro efeito manada, de sob o pretexto do risco da inflação – que depende mais de fora do que de dentro – pisar no freio da economia. Ao contrário, deve reforçar políticas de distribuição de renda para ampliar sua base interna de consumo, em doses bem mais acentuadas do que os programas de renda, miséria e habitação já anunciados. Representam apenas cerca de 1,1% do PIB. Deve imediatamente reduzir as taxas de juros bancários do governo (Selic) e dos bancos, as mais elevadas do mundo e causas centrais dos prejuízos que o País tem. O governo tem que botar limites e penalizações fortes sobre as taxas de juros e tarifas exorbitantes dos bancos. Tem poder para isso, mas não o exerce, pois está submisso e conivente ao poder do mercado financeiro.

Só de juros são jogados no lixo cerca de 6% do PIB todo o ano, o que obriga a se ter uma carga tributária onerosa, que causa informalização de empresas e empregos. Há que deslocar os benefícios da produção do sistema financeiro para a base da pirâmide social. Temos alto potencial de mercado interno disponível e elevados déficits sociais e de infraestrutura, que nos dificulta a concorrência com outros países e criam problemas sociais que poderiam não existir na magnitude atual.

Nesse sentido, o governo deveria tomar as rédeas da economia elevando as transferências de renda e reduzindo os custos com juros. Quanto mais demorar pior será para enfrentar os problemas existentes e os que virão importados, que são imprevisíveis em seus efeitos danosos ao País.

sexta-feira, 15 de julho de 2011

À Silvia Lobo: Como semente de Vida

Esta singela poesia é dedicada a militante da música e da vida que, infelizmente, não poderá continuar entoando sua voz possante, seu estribilho luminoso, seu encantar sereno.

Por Zé Lins

COMO SEMENTE DE VIDA

Nada lamentamos,
Nada choramos,
Nada lastimamos.

Não há tristeza, nem melancolia no ar!

Vidas hás temos a sonhar,
Como o toque da primeira paixão,
Como o incendiar de uma nova canção.

Vidas hás temos a brotar,
Como frondosa palmeira,
Cuja suculenta popa nutre nossa razão.
Como deslumbrante flor,
Com cálice exposto e suave canção no ar.

Vidas hás temos a doar,
Como o estalar do primeiro raio solar,
Como encanto do luar,
Como o perfume do mar.

Não há nada a se lastimar,
Nem a melancolia do adeus,
Nem o soçobrar do último beijo.

Vidas hás temos a partilhar,
Doando cada pedaço,
Distribuindo cada recado,
Provando cada parte de todas nossas partes!

Nada há a se entristecer,
Somente novas toadas,
Ensaios redobrados,
Voz solta ao vento,
E outros mundos a percorrer.

Vidas hás temos de paixão e mel!


sábado, 9 de julho de 2011

XVI Encontro Nacional de Economia Política: Carta de Uberlândia

Prezados leitores do PD13, estive na última semana de Junho participando do XVI Encontro Nacional de Economia Política, realizado pela Sociedade Brasileira de Economia Política. Neste Encontro que reúne anualmente os Economistas Radicais e Heterodoxos brasileiros foi aprovada a Carta de Uberlândia a qual trazemos para socialização com vocês.


                            Carta de Uberlândia

O segundo mandato do governo Lula encerrou-se sem que os principais problemas econômicos e sociais do país tenham sido enfrentados. Apesar disso, naquele momento, o índice de aceitação do presidente atingiu 86%, para o qual contribuíram fortemente, o crescimento do PIB em 2010, a recuperação parcial, mas expressiva, do valor do salário mínimo e os programas sociais assistenciais, principalmente o Programa Bolsa Família. Boa parte dos brasileiros que votou em Dilma Roussef para presidente o fez para garantir essa continuidade.

Iniciado o governo Dilma, o que estamos assistindo? De um lado, a repetição da manutenção quase exclusiva da prioridade do regime de metas para a inflação, o que supostamente provocou a elevação da taxa de juros básica, cortes e contingenciamento do orçamento da União, a restrição ao crédito e o recrudescimento do processo de apreciação cambial. De outro, o retorno da política de privatizações e das parcerias público-privadas, conforme eufemismo governamental, e a manutenção de vultosos superávits primários.

Em suma, no plano econômico, continuamos com uma das taxas de juros mais elevadas do mundo, o que torna o país presa fácil dos especuladores, nacionais e internacionais, fragilizando sua situação na conta de transações correntes. Por sua vez a valorização do real, que em alguns momentos atingiu níveis antes impensáveis, começa a colocar em risco a viabilidade econômica de vários setores industriais, o que não pode ser contrabalançado indefinidamente com reduções tributárias e expõe o país à possibilidade de uma crise de balanço de pagamentos em um futuro próximo.

E tudo isso em meio a uma crise econômica internacional que está longe de ter terminado, vide a situação da maioria dos países do continente europeu, onde segmentos crescentes de sua população têm ido às ruas se manifestar contra as “políticas de ajuste” impostas pelo FMI, com aumento de desemprego e reduções de salários e pensões dos aposentados. A Europa, à deriva, mostra quão frágil é a situação da economia brasileira, sujeita aos humores do capital especulativo e fortemente dependente da valorização das commodities.

Tomado em conjunto, o atual momento expressa à perfeição quão estreitos são os limites colocados pelas escolhas feitas pelos últimos governos, que procuraram fazer a economia crescer e a distribuição de renda melhorar sem resolver seus problemas estruturais e sem alterar a distribuição da propriedade e a relação entre salários e lucros, ou, em poucas palavras, acreditando que era possível servir simultaneamente a dois senhores.

É preciso começar a construir uma política econômica que supere esse quadro. Mas, no plano econômico, isso somente poderá ser feito com o abandono da camisa de força em que se constitui o regime de metas para a inflação e com o enfrentamento dos interesses daqueles que se beneficiam dos juros elevados e da insensata valorização de nossa moeda. Ademais, o tripé metas para a inflação, metas de superávit fiscal e câmbio flexível, com livre mobilidade de capital, com o crescente predomínio da produção agroindustrial e da exportação de commodities, não permite um desenvolvimento econômico pujante e sustentável econômica e ambientalmente. Muito pelo contrário, nos últimos anos a economia brasileira cresceu a taxas insuficientes para superar nossas carências econômicas e sociais históricas, e perseguir os desafios de uma sociedade avançada do século XXI. No plano geral e social, é preciso enfrentar os determinantes da pobreza absoluta e relativa, que não podem ser eliminados tão somente com políticas de transferência de renda, muito embora estas minimizem as agruras sofridas pelas famílias em pior situação.

Para que o Brasil caminhe na direção de um projeto de desenvolvimento nacional, autodeterminado politicamente e fraterno socialmente, é fundamental o aprofundamento radical da democracia política e econômica, com redistribuição do poder político, da renda e da riqueza, especialmente da propriedade da terra. Para isso é necessária a alteração das políticas econômicas neoliberais predominantes nos últimos governos, como bem demonstraram as discussões e os trabalhos apresentados neste XVI Encontro da Sociedade Brasileira de Economia Política.

Uberlândia, 24 de junho de 2011

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Proposta Democrática: Um ano de debate crítico


O PD13 completa um ano e comemoramos nossos quase cem seguidores. Convém realizar balanço desse período e ponderar motivos e causas para continuidade e fortalecimento do debate crítico em torno de dois eixos principais: os direitos democráticos e o socialismo.

As contradições e limites democráticos e socialistas se acirraram neste período, se por um lado a vitória de Dilma represente ou sinalize a continuidade de um projeto reformista adequado ao aprofundamento da revolução democrática, por outro, suas características e conformação de forças, com a presença de fortes setores conservadores e antisocialistas, nos coloca a necessidade de acompanhamento e estruturação de bloco de forças mais identificados com as tarefas de construção do socialismo.



No Pará a derrota do PT colocou o conservadorismo em forte ofensiva, claramente observável no extermínio de lideranças campesinas. Por outro, as apurações de corrupção na Alepa, contraditoriamente acirra a disputa política, porém não possibilita a articulação de eixo de forças de combate a tucanagem, sendo que as principais lideranças petistas ainda não se refizeram totalmente da derrota eleitoral.

Para além da disputa eleitoral, temos a organização do debate sobre o desenvolvimento e, como condição humana estratégica, do socialismo. O esforço de debate e organização de uma consciência coletiva pró-socialista e de radicalização democrática ainda converge as principais forças da esquerda do PT, porém os estreitos limites do processo eleitoral devem ser rompidos e se abrir a uma dimensão mais ampla que David Harvey[1] denominou de “uma concepção socialista dos direitos”.

Vale aqui algumas considerações em relação à luta e disputa ainda dentro da lógica do que se denomina de democracia burguesa. No geral os direitos sociais básicos tem uma trajetória de desrespeito no Brasil e na maior parte do globo, isso porque as contradições inerentes ao capitalismo se tornam mais acirradas em momentos de crise da dinâmica de acumulação, sendo que a ideologia burguesa nestes períodos tenciona com sua própria retórica de direitos.

O que demonstram as décadas de 1990 e 2010 é que mesmo nas economias capitalistas centrais, a flexibilização de direitos firmados no pós-guerra, se torna regra em conformidade as adequações da elevação da massa de mais-valia com vistas a contrariar o declínio da taxa de lucro e equacionar provisoriamente a crise do capital.

Neste sentido, é coerente a percepção apontada por David Harvey no seu livro “Spaces of Hope” de que “a tradição marxista se ocupe em dialogar na linguagem dos direitos, onde os principais argumentos políticos poderão ser ganhos”, essa forma de ver foi recentemente testada nas lutas por direitos políticos e econômicos observadas nas sociedades árabes.

O aprofundamento desse processo relaciona-se ao debate do projeto de desenvolvimento, rompendo com os atuais limites do debate centrado no crescimento econômico e nas relações de políticas compensatórias. O debate deve expor os conflitos inerentes ao atual modelo, demonstrando suas fissuras internamente, aprofundando a disputa e objetivação de direitos econômicos, inclusive propondo trajetória de desenvolvimento que aos poucos negue a acumulação capitalista e caminhe para sua superação. 

Neste um ano de existência o PD13 se dispôs a construir mais um espaço de exposição de ideias democráticas e socialistas, não sendo, obviamente, ponto de convergência, nem espaço de força central daqueles que lutam pelo socialismo, porém, humildemente, se oferece a escuta pública.   

Agradecemos aos quase cem seguidores e aqueles que acessando diariamente ou nos brindando com seus comentários e criticas reforçam este blog enquanto espaço plural, por outro agradecemos aos nossos colaboradores e esperamos continuar contando com os mesmos, assim como com novos propositores.
Saudações Democráticas e Socialistas!!!


[1] HARVEY, David. A produção capitalista do espaço.  São Paulo: Annablume editora, 2006.

domingo, 3 de julho de 2011

A Pauta de Exportação Primária Brasileira e a Amazônia

Por José Trindade & Wesley Oliveira

A balança comercial brasileira apresenta comportamento variado nas últimas duas décadas. Superavitária no começo dos anos 1990 e, de 1995 a 2000, deficitária. A partir daí o que se observa é superávit e crescimento considerável do saldo comercial, com as exportações crescendo em ritmo mais acelerado que as importações. Chegou ao pico em 2006, com saldo de US$ 46,5 bilhões, diminuindo o ritmo depois disso. O quiproquó porém são as características dessa exportação: baseada em produtos primários, com baixo valor agregado e localizada na região mais empobrecida do Brasil: a Amazônia.
Dos destaques dos produtos básicos, minério de ferro é o principal item da pauta de exportação, conforme evidenciado na Tabela 1 a seguir com os principais produtos exportados pelo país em 2010.
A soja também é outro importante produto. E, mesmo não estando (ainda) na lista, a carne bovina é outro item em franca ascensão. Em 2010, o Brasil exportou US$ 4,8 bilhões em carne bovina (80% sendo in natura). Vale ressaltar que o país é o maior exportador mundial de carne bovina.

Tabela 1 - Principais produtos exportados pelo Brasil – 2010
Descrição NCM
US$ (Mil)
MINERIOS DE FERRO NAO AGLOMERADOS E SEUS CONCENTRADOS
21.353.878
OLEOS BRUTOS DE PETROLEO
16.293.240
OUTROS GRAOS DE SOJA, MESMO TRITURADOS
11.035.210
ACUCAR DE CANA, EM BRUTO
9.306.851
MINERIOS DE FERRO AGLOMERADOS E SEUS CONCENTRADOS
7.558.004
CAFE NAO TORRADO, NAO DESCAFEINADO, EM GRAO
5.181.628
Outros
131.186.474
Total
201.915.285
                   Fonte: MDIC (2011).

Preocupa a observação que os produtos responsáveis pelo desmatamento são justamente os que estão em maior ascensão na pauta exportadora. E a Amazônia fornece boa parte deles, com destaque a pecuária bovina (carne e até boi vivo) e a soja.
Especificamente no caso da soja, o acompanhamento geoespacial feito pelo INPE há muito demonstrou a forte correlação entre as frentes de expansão produtiva e o forte incremento da floresta desmatada, em geral a soja aparece enquanto segunda geração de ocupação e alteração entrópica, após a expansão pecuária e a exploração madeireira.
No caso da extração mineral, o forte discurso ambientalista das principais empresas do setor contrasta com o efetivo padrão devastador da mesma. Vale observar que o ciclo minerador completo se constitui de três fases: i) o desmanche florestal, constituindo-se da remoção dos maciços florestais nas áreas a serem mineradas; ii) a extração da laterita e a exposição da jazida mineral; iii) o abandono da área atual e a abertura de nova frente. Em alguns casos as empresas mineradoras reconstituem uma floresta secundária, porém com enorme perda de diversidade.
Enfatizando apenas a exportação de produtos básicos, a dinâmica exportadora revela que a Amazônia dobrou sua participação no fornecimento nacional de produtos de menor valor agregado de 1995 para cá. A Tabela 7 a seguir mostra que no começo da série a região amazônica era responsável por cerca de 10% da exportação nacional de produtos básicos. No final da década de 1990 o percentual já apresenta aumento expressivo, atingindo o pico em 2009, com 23,2%. Tem-se, então, que quase um quarto de toda a exportação nacional de produtos básicos tem origem na Amazônia.

Tabela 2 - Exportações de produtos básicos, Amazônia e Brasil – 1995-2010


US$ Mil (FOB)
Ano
Amazônia
Brasil
%_Amazônia
1995
1.111.264
10.968.643
10,13
1996
1.150.058
11.900.127
9,66
1997
1.177.072
14.473.806
8,13
1998
1.763.530
12.976.630
13,59
1999
1.687.334
11.827.714
14,27
2000
2.078.022
12.564.214
16,54
2001
2.433.090
15.349.157
15,85
2002
2.739.186
16.959.138
16,15
2003
3.281.494
21.186.281
15,49
2004
4.923.374
28.528.571
17,26
2005
6.758.530
34.723.705
19,46
2006
7.833.855
40.280.500
19,45
2007
9.535.675
51.595.635
18,48
2008
15.157.183
73.027.660
20,76
2009
14.427.068
62.156.087
23,21
2010
20.014.744
90.147.293
22,20
                                     Fonte: MDIC (2010).
                                                        Elaboração dos autores.

Essa tendência de conversão da Amazônia em grande celeiro de produtos primários certamente não colabora no processo de desenvolvimento nacional e agrava as condições de exclusão social e de empobrecimento da região.
As condições de desenvolvimento regional parecem ainda mais agravadas pela relação contraditória entre desoneração da exportação e exportação de bens primários e semielaborados. A contradição presente relaciona-se a dois aspectos centrais: i) as cadeias de produção primário-exportadoras são muito curtas, o que estabelece a incapacidade de apropriação de rendas (mineradoras ou agrárias) que pudessem definir novos padrões sociais e ambientais para a região; ii) a segunda contradição relaciona-se bastante com a anterior e refere-se a desoneração tributária para exportação desse tipo de bem estabelecida pela Lei Complementar 87/96 (Lei Kandir), sem contudo nenhuma solução federativa ser oferecida. Os estados exportadores líquidos acabam tendo o ônus ambiental e social, sem o devido retorno, seja tributário, seja oriundo de acordo federativo.
O Brasil não pode encarar o Pará e o Mato Grosso, os dois principais estados exportadores, como meros apêndices geradores de divisas. É urgente o debate de uma agenda de desenvolvimento para a Região Amazônica e especificamente para esses dois Estados.